contos indígenas

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Elisângela Pimenta

domingo, 10 de julho de 2011

ESCOLA MUNICIPAL CHIRLENE CRISTINA PEREIRA

Disciplina: Português Turma: 9 ano A e B

Professora: Elisângela Vitor Data:________/_________/ 2010


Leia o texto abaixo para responder as questões propostas.



Canta Brasil

As selvas te deram nas noites Também na beleza desse céu

Teus ritmos bárbaros Onde o azul é mais azul

E os negros trouxeram Na aquarela do Brasil

Reservas de pranto Eu cantei de Norte a Sul

Os brancos falaram de Mas agora o teu cantar

Amor Meu Brasil quero escutar

Em suas canções Nas preces da sertaneja

E dessa mistura de vozes Nas ondas do rio-mar

Nasceu o teu canto Ô esse rio turbilhão

Brasil Entre selvas de rojão

Minha voz enternecida Continente a caminhar

Já adorou os teus brasões No céu, no mar, na terra

Na expressão mais comovida Canta Brasil

Das mais ardentes canções

Gal Costa. (Composição: Alcir Pires Vermelho / David Nasser)



1) Procure no dicionário as palavras:

a) pranto b) brasão c) turbilhão d) aquarela



2) Os dois primeiros versos da canção nos falam de um dos povos formadores de nossa população. Qual é esse povo? Onde vivia?



3) A raça negra trouxe “reservas de pranto”. Por quê? O que você sabe sobre a história dos negros no Brasil?



4) Quais as vozes que se misturaram para formar o “canto brasileiro”?



5) “Eu cantei de Norte a Sul”. Como podemos caracterizar esse eu que fala na canção?



6) A quem se dirige a canção? Coma você sabe disso?



7) Segundo a letra da canção, como é possível ouvir o “canto do Brasil”? Onde esse canto pode ser encontrado?



8) Quais são os “brasões”, os “símbolos” do Brasil de que nos fala o texto? (Há uma só alternativa correta).

a) A bandeira nacional. b) A natureza brasileira. c) As mais ardentes canções.



9) “Continente a caminhar”. Porque o Brasil é chamado de país-continente?
COMO APARECERAM OS ANIMAIS

Motivo dos índios caingangues

Depois do dilúvio, a Terra ficou desabitada. Salvaram-se alguns homens da tribo dos caingangues, mas nenhum dos animais que antes viviam pelas matas e campos.
Sem o trinado dos pássaros e os gritos dos animais, o silêncio das noites era aterrador. E muito triste a solidão dos dias. Com medo das trevas, os índios acendiam fogueiras para dormir ao seu redor. Continuamente, pediam a Tupã que mandasse bichos para o mato e soltasse aves no céu.
Afinal, Tupã compadeceu-se e resolveu atendê-los.
Mandou então Cadjurucre, herói já morando no céu, que descesse à Terra e criasse animais. Deveria também dizer a cada um deles quais os seus modos e meios de vida, costumes, alimentos, obrigações.
Cadjurucre descia todas as noites, trabalhava e voltava ao céu à primeira luz da aurora. Com o orvalho recolhido às folhas da taioba, umedecia as cinzas e os carvões da primeira fogueira acesa pelos homens, passado o dilúvio. Usando a mistura, modelava os animais. Enquanto seus dedos davam forma aos bichos, repetia.as ordens de Tupã aos futuros moradores dos matos, campos e rios.
Na primeira noite fez a onça, que é a rainha da selva. Na segunda, o guariba, que domina as altas árvores. Em seguida, o gavião-de-penacho, o gambá, a arara, a guaiquica, o jacaré, a capivara, a pacarana, o veado e uma infinidade de aves e peixes.
Seu trabalho tomou muito tempo. Ensinou a suçuarana a miar, o veado a correr e a saltar, o macaco a trepar pelos troncos e cipós. Fez o tatu cavar buraco, mandou a tartaruga nadar, quando estivesse no rio, e caminhar, quando estivesse em terra. Ao amanhecer, o bicho criado durante a noite sumia rumo a sua morada.
Certa manhã, de volta ao céu, ouviu de Tupã:
— Basta de criar animais. Céu e Terra estão de tal modo cheios que eles já lutam entre si. Há caça suficiente para os homens. Não precisa voltar à Terra!
Cadjurucre explicou:
— Restam três carvões e um punhado de cinzas.
Diante disso, Tupã concedeu:
— Na próxima noite, você criará o último animal. Não deixe sobras das cinzas e dos carvões. Depois, descansará. A floresta, o campo, as águas e o céu estão cheios de vida.
Ao anoitecer, o enviado de Tupã começou a trabalhar com grande vontade. Queria aproveitar todo o material sobrado da primeira fogueira.
Fez coisas extravagantes Modelou uma cauda longa e larga, um corpo grande e forte, braços robustos, unhas compridas e afiadas. E um focinho mais longo, bem mais longo do que o focinho dos outros bichos. Não poupou nada. Nem um cisquinho de carvão, nem uma pitadinha de cinza, O último bicho estava saindo o mais desproporcionado da criação!
Trabalha e trabalha, põe uma coisa daqui, um pelo dali, uma mancha deste lado, uma cor mais forte do outro, e de repente viu-se surpreendido pelo anunciar do dia. E não havia terminado o trabalho! Faltavam, ao estranho animal, a língua e os dentes!
Clareava. Devia voltar ao céu.
Cadjurucre, num gesto rápido, colheu uma folha de capim, longa, macia e flexível, e enfiou-a na boca do animal. Já não tinha tempo para outra coisa. O Sol nascia!
De partida, disse ao bicho que acabava de criar:
— Essa é a sua língua. Você já pode falar. Corra para o campo que o dia vem nascendo.
Mas o bicho não se moveu, como que esperando por mais alguma ordem.
Cadjurucre, subindo para o céu, perguntou:
— E então?! O que espera?! A criação está terminada. Não posso fazer mais por você!
O animal, erguendo-se sobre as patas traseiras e apontando para a boca disforme, gritou:
— Se não possuo dentes como os outros animais e se tenho uma língua comprida e macia, mas pouco resistente para as comidas duras, o que é que vou comer?
Quase desaparecendo entre as nuvens e os raios do Sol, Cadjurucre aconselhou:
— Pois, se não tem dentes, deve alimentar-se do que não precisa ser mastigado: formigas! Para apanhá-las, use a língua comprida e ágil!
Já com fome, o bicho partiu à procura de formigueiros. Ainda anda pelo mato e pelo campo, com o longo focinho e a cauda em forma de leque, à cata de formigueiro. Quando o encontra, mete por ele a língua e recolhe o seu alimento: formigas.
Por isso, os índios chamaram esse animal pelo nome de tamanduá, que para eles quer dizer: caçador de formigas!

DONATO, Hernâne. Contos dos meninos índios. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2006.


UM CONSELHO CONTRA O CONSELHEIRO

Motivo dos índios guaicurus

A última coisa que Tupã criou, neste mundo, foi o homem.
Havia criado os rios, as plantas, os animais e as aves. Por fim, as tribos. Bondoso, antes de permitir que os homens saíssem a povoar a Terra, mandou distribuir presentes que fossem de utilidade para a vida.
A medida que ia partindo, cada tribo recebia um conselho ou um dom especial. Uma delas aprendeu a cultivar a mandioca e o algodão, para que nos tempos de carestia pudesse viver com o produto das lavouras. A outra foi ensinado fazer canoas e preparar o timbó, para que se dedicasse à pesca.
Ao chegar a vez da tribo guaicuru, já não havia o que dar. Assim, a sua gente saiu pelo mundo entregue a si mesma.
Mas não se conformou com isso. Decidiu pedir a Tupã o favor especial ao qual se julgava com direito. Toda a tribo, homens e mulheres, idosos e jovens, saiu à procura de quem pudesse levar sua queixa ao céu.
Pediram ao vento, que sopra livre e violento pelos descampados, para que, com sua poderosa voz, levasse a Tupã o pedido dos guaicurus.
Mas o vento estava apressado. Passou, encrespando as águas, revolvendo as folhas, e nem sequer ouviu a súplica dos índios.
Pediram ao relâmpago, que rasga o céu e sacode a terra. Mas ele fulgurou e desapareceu, sem lhes dar atenção.
Foram para junto da árvore mais alta da floresta, aquela que quase tocava as nuvens com a sua ramagem, e lhe pediram que nas suas conversas com as estrelas dissesse do desejo da tribo. A árvore, imóvel sob o sol do meio-dia, dormitava e não os atendeu.
Assim caminhou a tribo. Cada vez mais desgostosa. De planta em planta, de animal a animal. Poucos respondiam. Desses poucos, um dizia que suas asas não o levariam tão alto e outro se desculpava alegando que as raízes o prendiam ao chão.
Um dia passaram debaixo do ninho do caracará. O gavião, ouvindo como se queixavam, intrometeu-se:
— Vocês não têm razão!
Os índios estranharam:
— Como assim?! Somos o único povo a não receber de Tupã um favor especial. E contra isso que reclamamos.
O caracará, sempre disposto a tirar proveito dos sofrimentos dos outros, ideou plano que lhe trouxesse vantagem.
— Vocês não entenderam o desejo de Tupã. O presente dado aos guaicurus é maior e melhor do que todos os outros. Se não receberam nada especial é porque tudo quanto existe é de vocês. E de vocês a liberdade de se apoderar do que aparecer em seu caminho. Podem, portanto, caçar e tomar quanto encontrarem e desejarem.
Os índios, admirados e surpresos, pediram ao gavião que explicasse melhor qual o presente que, sem saber, haviam recebido.
O espertalhão repetiu:
— E a liberdade de tomar para si tudo quanto encontrarem em seu caminho e lhes agradar.
Depressa os homens se convenceram de que o caracará tinha razão. O cacique insistiu:
— Então podemos matar tudo o que encontrarmos?
A ave rapineira, certa de que os guaicurus fariam, daquele dia em diante, grandes caçadas das quais ela tiraria a melhor parte, assegurou:
— Sim, tudo!
Rápido, o cacique armou o arco de guerra e visou o caracará.
Percebendo o perigo, o gavião mau conselheiro tentou fugir. Mas ainda não havia aberto de todo as asas, e a flecha partira do arco...
E era uma vez um caracará!
A tribo dos guaicurus tomou para seu símbolo a figura do caracará que os ensinou a caçar, e desde esse dia seguiu de perto os seus conselhos.

DONATO, Hernâne. Contos dos meninos índios. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2006.


OS CURUMINS QUE SE TORNARAM ESTRELAS

Era uma vez sete orfãozinhos.
Quando ficaram sem os pais, foram viver com a avó, índia tão velhinha que mal podia cuidar de si mesma. No entanto, repartia de bom coração, e com amor, as suas pobres coisas entre os sete netos.
Mas não demorou e a boa velha morreu também.
Os curumins ficaram sem parente com quem morar.
Passavam o dia com fome e a noite com frio.
O maiorzinho saía à procura de alimentos, trazendo, às vezes, frutas, mel e raízes. Mas era pequeno demais para subir às árvores e fraco para tentar a caça. Com isso todos sofriam, pois raramente tinham alimento suficiente.
Uma noite, deitados, bem apertadinhos para aquecerem uns aos outros, ouviram chegar o vento.
Nas paredes de palha da cabana antiga, o vozeirão do vento cantava assim:
—Uh!... Uh!... Uh!...
O mais velho dos irmãos lembrou:
O vento vem do céu e está quase sempre contente! Não é um grande brincalhão? Ele encrespa as águas, despetala as flores, derruba os frutos, revolve os galhos. O lugar onde ele mora deve ser o país da alegria! Vamos todos para o céu?! Lá, certamente, não hão de faltar peles para nos cobrir, frutos e mel para nos alimentar, brinquedos para nos divertir e mãos amigas para nos acariciar!
Todos concordaram e se aprontaram para subir ao céu. O resto da noite ficaram imaginando como seria a vida lá em cima.
Ao amanhecer, o vento que vinha de regresso, depois de percorrer toda a Terra, ouvindo o desejo dos pequenos e sentindo pena deles, começou a soprar, devagar, devagar...
Levados pelo vento, os curumins foram subindo, subindo, passaram pelas nuvens, mais alto, sempre mais alto... Quando anoiteceu, estavam quase no céu. Mas já era tarde, e o vento devia voltar a soprar pelas terras de todos os homens, pois essa é a sua obrigação, noite após noite. Deixou os meninos ali, um pouco abaixo do céu, um pouco acima das nuvens!
Tupã, vendo os pobrezinhos naquela posição incômoda, nem na terra, nem no céu, transformou-os em estrelas. Formaram a constelação que os índios chamam “Sete-Estrelo” — e os civilizados, “Plêiades” —, em homenagem aos irmãozinhos que, depois de muito sofrer na Terra, receberam no céu luminosa recompensa!

DONATO, Hernâne. Contos dos meninos índios. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2006.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

AVALIAÇÃO PORTUGUÊS

Na caixinha de morar
Daniel Munduruku

Quando chegamos à cidade, o Sol já estava adormecido fazia tempo, mas não dava para ver as estrelas, por causa da luz que havia nas casas e nas ruas. Me deu saudade mais uma vez, mas a sonolência não me permitiu ficar pensando nas coisas da aldeia.
Fomos levados para um lugar que achei bem estranho. Não era apenas uma casa, mas uma espécie de caixa igual a essas que a gente faz para colocar a mandioca depois de ralada.
Esse lugar, que todos chamam de prédio, é estranho porque as pessoas não usam as pernas para subir, mas são carregadas por uma outra caixinha, que sobe e desce o dia todo. Ela é tão pequenina que achei que fosse uma espécie de buraco onde a gente coloca os que morrem Meu pai disse que isso que sobe e desce, carregando pessoas para as caixinhas onde elas moram, se chama elevador.
Quando chegamos à nossa caixa, não encontrei redes de dormir, mas camas bem molinhas e boas de pular em cima. Tinha uma porção de lugares que a gente podia ir quando quisesse, mas com uma única diferença: não havia árvores para a gente brincar ou apanhar frutas. Tudo era esquisito. Lembro que comentei com meu pai que devia ser bem difícil ser criança naquele lugar, pois não tinha lugar para fazer fogo: não tinha rio para nadar, nem para se banhar; apenas urna latinha que jogava água do céu como se fosse chuva e a gente ficava debaixo dela durante um bom tempo.
Comecei a ficar com vontade de voltar para casa.
Fiquei pensando como eles conseguem construir algo tão estranho, tão frio, tão morto. Pensei isso porque a nossa casa é feita com o corpo de nossas irmãs árvores e coberta com os cabelos das palmeiras, nossas parentas. Nossas casas são construídas uma em frente da outra só para a gente poder olhar para os nossos vizinhos, conversar com eles e saber como cada um está. Aqui até parece que uns têm medo dos outros.
O DIÁRIO DE KAXI - um índio descobre o Brasil. São Paulo: Salesiana, 2001, p. 16 – 17

Questão 1.
Qual é o sentido da palavra “bom” no trecho seguinte:
“... não tinha rio para nadar, nem para se banhar, apenas uma latinha que jogava água do céu como se fosse chuva e a gente ficava debaixo dela durante um bom tempo”.
( ) bondoso, benévolo; ( ) misericordioso, caritativo;
( ) competente, eficiente; ( ) longo;
( ) gostoso, saboroso.

Questão 2.
Por que, na aldeia do narrador, era possível ver as estrelas à noite?
Questão 3.
A personagem narradora chegou à cidade só ou acompanhada? Que pista há, no primeiro parágrafo, para sua conclusão?
Questão 4.
Marque o significado da expressão destacada no trecho seguinte:
“Quando chegamos à cidade, o sol já estava adormecido fazia tempo, mas não dava para ver as estrelas, por causa da luz que havia nas casas e nas ruas.”
( ) O sol estava encoberto por nuvens. ( ) Já era noite.
( )Não se via o sol. ( ) Chovia e não havia sol.
Questão 5.
Para o índio, de que uma criança sentiria falta naquele lugar? Justifique sua resposta.
Questão 6.
Qual é o significado da expressão destacada e o que ela sugere?
“Me deu saudade mais uma vez, ...”

Os estatutos do homem

Os Estatutos do Homem – Ato Institucional Permanente (Thiago de Mello)

Artigo I
Fica decretado que agora vale a verdade.
agora vale a vida,
e de mãos dadas,
marcharemos todos pela vida verdadeira.

Artigo II
Fica decretado que todos os dias da semana,
inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a converter-se em manhãs de domingo.

Artigo III
Fica decretado que, a partir deste instante,
haverá girassóis em todas as janelas,
que os girassóis terão direito
a abrir-se dentro da sombra;
e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
abertas para o verde onde cresce a esperança.

Artigo IV
Fica decretado que o homem
não precisará nunca mais
duvidar do homem.
Que o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento,
como o vento confia no ar,
como o ar confia no campo azul do céu.

Parágrafo único:
O homem, confiará no homem
como um menino confia em outro menino.

Artigo V
Fica decretado que os homens
estão livres do jugo da mentira.
Nunca mais será preciso usar
a couraça do silêncio
nem a armadura de palavras.
O homem se sentará à mesa
com seu olhar limpo
porque a verdade passará a ser servida
antes da sobremesa.

Artigo VI
Fica estabelecida, durante dez séculos,
a prática sonhada pelo profeta Isaías,
e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.

Artigo VII
Por decreto irrevogável fica estabelecido
o reinado permanente da justiça e da claridade,
e a alegria será uma bandeira generosa
para sempre desfraldada na alma do povo.

Artigo VIII
Fica decretado que a maior dor
sempre foi e será sempre
não poder dar-se amor a quem se ama
e saber que é a água
que dá à planta o milagre da flor.

Artigo IX
Fica permitido que o pão de cada dia
tenha no homem o sinal de seu suor.
Mas que sobretudo tenha
sempre o quente sabor da ternura.

Artigo X
Fica permitido a qualquer pessoa,
qualquer hora da vida,
uso do traje branco.

Artigo XI
Fica decretado, por definição,
que o homem é um animal que ama
e que por isso é belo,
muito mais belo que a estrela da manhã.

Artigo XII
Decreta-se que nada será obrigado
nem proibido,
tudo será permitido,
inclusive brincar com os rinocerontes
e caminhar pelas tardes
com uma imensa begônia na lapela.

Parágrafo único:
Só uma coisa fica proibida:
amar sem amor.

Artigo XIII
Fica decretado que o dinheiro
não poderá nunca mais comprar
o sol das manhãs vindouras.
Expulso do grande baú do medo,
o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
para defender o direito de cantar
e a festa do dia que chegou.

Artigo Final.
Fica proibido o uso da palavra liberdade,
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
e a sua morada será sempre
o coração do homem.

(Santiago do Chile, abril de 1964 dedicado a Carlos Heitor Cony)

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Leia o texto a seguir para responder às questões de 01 a 10.

As duas bonecas
(Conto de António Sérgio)

Lá longe, na Índia, havia um rei que tinha uma filha. Ora, queria o rei que a sua filha casasse com um homem de muito juízo. "O noivo da minha filha (dizia ele) pode ser fidalgo, valente, bonito e rico - tudo isso será bom; mas mais que tudo, antes e acima de tudo, eu quero que o noivo da minha filha seja um homem de muito juízo, uma pessoa discreta e de muito bom senso."
Um dia, o rei mandou fazer duas bonecas muito bem feitas, do tamanho de pessoas crescidas. Era olhar para elas, e vê-las iguais - mesmo iguaisinhas. As caras das duas eram iguais; os corpos, iguais; os tamanhos, iguais; os vestidos, iguais; - tudo igual. Não se via diferença: mesmo iguaisinhas.
O rei, depois, mandou pôr as duas bonecas à porta do seu palácio. Um arauto avançou por ordem dele, e gritou assim, para que todos ouvissem:
- Olá! Ouçam todos o que eu vou dizer! Ouçam todos, e passem palavra do que vão ouvir! À porta do palácio estão duas bonecas. O homem (quem quer que ele seja) que for capaz de dizer certinho em que é que as bonecas não são iguais - esse casará com a nossa princesa, e virá um dia a ser rei!
A notícia correu de terra em terra, e por toda a parte se dizia o mesmo, - por todas as cidades, por todas as aldeias, por todos os campos. "Casará com a princesa, virá a ser rei, quem for capaz de descobrir em que é que as bonecas não são iguais."
E desde então, de dia e de noite, passava gente de todas as partes - pelas estradas, pelas veredas, pelos caminhos, uns nos seus carros, outros montados, muitos a pé, - para verem na porta as bonecas do rei. Eram monarcas, eram fidalgos, eram pastores, que todos se punham a ver e mirar. Viam em cima, viam em baixo, viam à frente, viam aos lados, viam atrás. Olhavam, fitavam, espreitavam, contemplavam, inspecionavam, examinavam - e nada, nada, nada! Ninguém via diferença alguma. Eram iguais!
- Não sei. Não vejo diferença - diziam todos - parecem-me iguais.
E os cozinheiros, portanto, não tiveram de cozinhar o banquete para o dia do casamento da princesa. Por fim, apareceu numa manhã um homem alegre e muito novo - um jovem - de olhos brilhantes e de gesto calmo, que parecia pensar as coisas bem pensadas, até adivinhar, bem adivinhadas, as adivinhas que lhe propusessem. Ouvira falar do aviso do rei, e queria ver, também ele, as duas bonecas! Colocou-se, pois, adiante das duas, e esteve muito tempo a examiná-las. Não via, também, nenhuma diferença. Os olhos de uma eram iguais aos da outra; iguais as mãos, os braços, os pés, os vestidos. Tudo igual! Saiu o jovem de perto das bonecas. Passeou, pensando, de um lado para o outro. Franziu os sobrolhos. Cruzou as mãos por trás das costas. Fechou os olhos. Inclinou a cabeça...
De repente, lembrou-lhe uma coisa. Foi ver as orelhas das duas bonecas. Viu também as suas bocas. Procurou depois qualquer coisa pelo chão, até que encontrou uma palhinha. Pegou na palhinha, e voltou para as bonecas. Então, meteu a palhinha por dentro do ouvido de uma delas. Foi empurrando, empurrando, empurrando, até que viu sair a outra ponta pela boca da boneca, ao meio dos lábios. Puxou então por essa ponta, e assim tirou a palhinha para fora. Foi depois à outra boneca - a da esquerda -, e meteu-lhe a palha para dentro do ouvido. Empurrou a palha, empurrou, olhando para os lábios dessa mesma boneca. Empurrou mais. Não saía. Empurrou tudo, até ao fim. A palha desapareceu. Tinha caído, certamente, para dentro do corpo. Não havia passagem do ouvido para a boca.
Então, chamou um criado, e disse-lhe assim:
- Faça favor de dizer a rei que lhe peço para lhe falar sobre as bonecas. Já dei com o segredo.
O rei mandou-o entrar. O jovem inclinou-se, cruzou as mãos sobre o peito.
- Pode falar - disse-lhe o rei.
- Meu senhor - começou o jovem - uma das bonecas é melhor que a outra, porque não atira pela boca fora tudo o que lhe entra pelos ouvidos; ao passo que a outra deixa sair pela boca, tudo que pelos ouvidos se lhe meter. Uma não repete, pois, tudo aquilo quanto ouve dizer; a outra é linguareira e indiscreta.
- Ora até que enfim! - declarou o rei - Trataremos de preparar a festa de noivado. Este jovem tem juízo, e há-de casar com minha filha!
E então é que foi trabalho, meus amigos, para os cozinheiros, os alfaiates, os criados, os mordomos, os oficiais, e toda a demais gente do real palácio!
E isso é que foi uma festa, a do casamento da filha do rei!

SÉRGIO, Antônio. Os conselheiros do Califa. Sá da Costa Editora.

Vocabulário:
Arauto: mensageiro do rei.
Mordomo: administrador de um palácio; chefe dos criados de uma grande casa.
Sobrolho: sobrancelha.
Vereda: caminho estreito, atalho.
Linguareira: que solta a língua, que fala demais.
Indiscreto: pessoa que revela abertamente o que deveria ser tratado com reserva ou mantido em segredo.

1. Quem é o autor do texto? (1,5)
__________________________________________________________________________________________
2. Onde aconteceu o fato narrado no texto? (1,5)
_________________________________________________________________________________________
3. Além de ajuizado, que outras duas qualidades deveria ter o noivo? (1,5)
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________4. Transcreva do texto o que dizia o arauto por ordem do rei. (1,5)
___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________5. O que se passou depois que a notícia se espalhou? (1,5)
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________________
6. “Por fim, apareceu numa manhã um homem alegre e muito novo - um jovem - de olhos brilhantes e de gesto calmo, que parecia pensar as coisas bem pensadas...” O que esse jovem foi fazer no palácio? (1,5)
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________________
7. Depois de examinar as bonecas, qual foi a primeira conclusão do jovem? (1,5)
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

8. Transcreva do texto uma frase que indique que estava difícil para o jovem encontrar uma solução para o problema. (1,5)
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
9. O jovem concluiu que as bonecas tinham uma grande diferença. Qual era essa diferença? (1,5)
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
10. “Ora até que enfim! – declarou o rei - Tratemos de preparar a festa do noivado. Este jovem tem juízo...” Porque concluiu o rei que o jovem tinha juízo? (1,5)
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Aspectos gramaticais
11. Leia a tirinha abaixo para responder as questões que seguem:


a) Quando Calvin pensa “aí vem o furacão...” (1ª quadrinho), a que ele estava se referindo? (4,0)
( ) a uma notícia sobre uma tempestade que ele ouviu na televisão.
( ) ao chapéu que estava usando para se proteger do furacão.
( ) à reação de sua mãe ao ver que ele havia cortado seu cabelo.

b) O pronome isso (3° quadrinho) se refere: (4,0)
( ) ao tigre Haroldo.
( ) ao chapéu que estava em cima da mesa.
( ) a cortar o cabelo.

c) É pronome possessivo: (4,0)
( ) eu. ( ) seu. ( ) isso.

d) O verbo tire (1º quadrinho) indica: (4,0)
( ) uma ordem. ( ) uma probabilidade de algo acontecer. ( ) uma certeza.

e) A palavra mesa é: (4,0)
( ) adjetivo. ( ) substantivo. ( ) verbo.
Leia o texto abaixo e responda as questões propostas:


No início do mundo
Aturi Kayabi

No início do mundo as coisas eram todas mal feitas.
Não tinha a noite, só existia o sol.
O dia não tinha fim.
As pessoas trabalhavam sem parar.
Quando dava sono nas pessoas, elas dormiam, acordavam, o sol ficava no mesmo lugar.
O sol era muito quente, a gente assava peixe, cozinhava e torrava farinha, na quentura do sol.
Até que certo dia, o pajé pensou em mudar.
Ele pegou duas cabaças de amendoim, uma com amendoim branco, outra com amendoim preto.
Primeiro, ele quebrou a cabaça de amendoim preto, e a noite chegou.
O pajé dormiu para fazer a distância da noite.
Ele acordou às 3 horas da madrugada e disse: vou dormir mais um pouco.
Quando deu 5 horas, ele quebrou outra cabaça de amendoim branco e o dia clareou.
Por isso que temos o dia e a noite.


(Em: *Antologia da floresta*. Rio de janeiro: Editora Multiletra, 1997. p. 12.)

1. Procure na lenda três coisas que estão relacionadas com a cultura dos índios. Escreva no seu caderno.

2. As lendas indígenas contam como surgiu alguma coisa. Observe a lenda "No início do mundo". Segundo ela, como surgiram o dia e a noite?

3.Você conhece outra explicação para o fato de haver o dia e a noite? Converse com os colegas e dê a sua opinião.

ASPECTOS GRAMATICAIS

1. Leia este texto:

O nascimento das estrelas
Lenda indígena

As índias precisavam colher milho para fazer a comida da tribo. Chamaram os curumins ''''' foram com eles para a roça.
Não demorou muito ''''' eles encontraram muitas espigas amarelinhas.
''''' os curumins eram gulosos, pegaram todo o milho, trouxeram para a aldeia ''''' deram para as avós fazerem bolos. ''''' eles comeram tudo!
''''' os curumins ficaram com medo das índias. Pediram aos colibris que amarrassem um cipó no topo do céu ''''' começaram a subir nele.
''''' as mães voltaram da roça, ficaram assustadas vendo os curumins subindo no cipó. Resolveram subir também, atrás deles.
''''' as mães caíram no chão e se transformaram em onças. ''''' os curumins já não podiam mais voltar para a Terra ''''' ficaram para sempre no céu, transformados em gordas estrelas.

1.Faça um desenho para esse texto no seu caderno.

2. Copie o texto no caderno e deixe os pontinhos. Depois responda: Quantos parágrafos tem o texto? Pinte cada parágrafo de uma cor diferente.

3. Dentro dos pontinhos escreva palavras para ligar as frases do texto. Escolha as palavras que você achar adequadas ao texto.
e -- quando -- mas -- como -- então -- daí -- aí

Essas palavras que você usou para ligar as frases do texto são chamadas de *conectivos*.
Os *conectivos* "amarram" as palavras do texto para que as frases não fiquem soltas. Eles fazem a *conexão* entre as frases do texto. Existem muitos *conectivos* na nossa língua. Veja alguns:
e -- mas -- porém -- quando -- então -- se -- daí -- ou -- conforme -- porque

4. Trabalho em grupo:
• Encontre um texto em jornais ou revistas, recorte-o e cole em papel grosso, como cartolina.
• Copie os conectivos do texto em uma folha de papel. Cole a folha em cartolina e depois recorte cada um dos conectivos.
• Cubra os conectivos do texto com caneta até não dar para ler.

A classe deve arrumar duas caixas. Em uma ficam os textos e na outra os conectivos recortados.
Cada grupo sorteia um texto. Os conectivos ficam na caixinha. Os grupos podem escolher, quais conectivos devem ser usados no texto sorteado?

Produção de texto

O Brasil já foi só dos índios. Hoje muitas nações indígenas têm contato com a cultura branca e acabam mudando seus costumes.
Mas existem muitas nações que estão lutando para preservar as suas tradições.

Leitura e interpretação de texto


As serpentes que roubaram a noite

Fazia pouco tempo que o mundo era mundo e que as garras da onça ainda não haviam crescido e já reinava a insatisfação. E isso porque a noite nunca chegava – ela, que iria
permitir que pessoas e animais repousassem um pouco.

O sol brilhava sem parar nos céus e nenhum daqueles infelizes conseguia sequer tirar
uma pequena soneca! Os raios ardentes do sol queimavam tanto durante tanto tempo que
todos preferiam levantar. Apenas o papagaio continuava a protestar, mas tão alto, que toda afloresta o ouvia, porém o sol pouco se importava com toda aquela gritaria e seguia brilhando tão alegremente como antes.

Após um certo tempo, o papagaio ficou rouco, e os outros seres arrastavam-se como
sombras. No leito dos rios quase não se via uma gota d'água a correr.

Felizmente, um belo dia, os índios descobriram quem havia escondido a noite: as serpentes! Elas eram os únicos seres que não tinham definhado, continuavam sadias e
passeavam com um arzinho zombeteiro, como se estivessem guardando na cabeça
pensamentos muito divertidos.

Então, os líderes da aldeia organizaram uma reunião para indicar aquele que deveria ir
falar com as serpentes para que elas libertassem a noite. A escolha caiu sobre o jovem Karu Bempô por ser guerreiro valente e excelente corredor.

Karu Bempô, o mais valoroso dos guerreiros indígenas, foi falar com Surucucu, a grande chefe das serpentes.

A morada de Surucucu ficava escondida no fundo da floresta virgem, embaixo das folhas spalhadas pelo chão, e nem os macacos gostavam de se aproximar daquele lugar
misterioso.

- Quem se atreve a me incomodar? - gritou a serpente, erguendo a cabeça.

- Sou eu, Karu Bempô, o grande guerreiro – respondeu o intrépido representante dos índios e prosseguiu: - Dizem que as serpentes esconderam a noite, darei arco e flechas
como presente do meu povo.

- De que me serviriam o arco e as flechas? - riu Surucucu. - Não tenho mãos para manejá-los. Meu rapaz, tens de me trazer outra coisa.

Após dizer essas palavras, ela deslizou por entre as folhas e desapareceu, e Karu Bempô se viu sozinho.

Voltou à aldeia de mãos vazias, e todos ficaram quebrando a cabeça para descobrir o que dar à serpente.

Finalmente, depois de muito pensarem, imaginaram que uma matraca contentaria a serpente, pois é um objeto que agrada a todos, e nenhum animal possui um objeto desses. Fizeram então uma matraca, cujo som era ouvido para além das planícies e das montanhas. E Karu Bempô pôs-se novamente a caminho.

Dessa vez, Surucucu estava esperando-o.

- Sei que me trazes uma matraca – disse ela. - Evidentemente, não é coisa que se despreze, mas como vou usá-la? Não tenho mãos nem pés...

- Vou prendê-la na tua cauda – disse Karu Bempô, e imediatamente pôs mão à obra. Mas que aconteceu? Ou a matraca tinha perdido a voz ou a cauda da serpente não era suficientemente forte para balançá-la. Quando ela tentou chacoalhar sozinha, ouviu-se apenas um ch-ch-ch-ch parecido com o ruído que as folhas secas fazem quando se espalham pelo chão.

- Não, isso eu não quero. Mas, para que não digam que sou insensível, te darei, em troca da matraca, uma breve noite – declarou afinal a serpente. Deslizou para dentro do ninho e retornou trazendo um saquinho de couro, que entregou a Karu Bempô.

- E que faremos se esta noite não nos bastar? - perguntou ele.

- Deves saber que uma noite longa custa muito caro: nem por dez matracas eu poderia te dar uma – respondeu a serpente.

- Nesse caso, o que queres em troca?

- Conversei com as outras serpentes a esse respeito e decidimos que trocaríamos uma noite longa por uma jarra cheia daquele veneno que teu povo coloca nas flechas.

- Mas que ireis fazer com esse veneno? - recomendou Karu Bempô.

Sua pergunta não recebeu resposta. Surucucu deslizou sob as folhas. A matraca presa à cauda fez-se ouvir por um momento, e depois a serpente desapareceu.

Caminhando lentamente, Karu Bempô retornou à aldeia com o saquinho de couro. Acalentava a esperança de que a noite curta seria suficiente para todos, mas em seu espírito permanecia o receio de um novo encontro com a serpente. Assim que os índios abriram o saquinho, o mundo foi invadido pelas trevas e todos caíram num sono profundo, mas não por muito tempo. Passados alguns instantes, o sol voltou a brilhar e expulsou a escuridão para trás das montanhas e despertou sem piedade aqueles infortunados adormecidos.

Todo dia acontecia a mesma coisa, e logo ocorreu aquilo que Karu Bempô temia; perceberam que uma noite tão curta não bastava para descansar e todos começaram a juntar veneno – às vezes, apenas uma gota – para encher a jarra.

O jovem retornou à floresta pela terceira vez. Dessa vez caminhava com cautela, pois
tinha receio de tropeçar e deixar cair a jarra. Surucucu estava enfiada em seu ninho, e via-se apenas sua cabeça. Ao lado dela havia um enorme saco, bem cheio. Eu sabia que voltarias – disse ela ao recém-chegado. - Vê, preparei um saco que contém uma noite longa.

Karu Bempô entregou-lhe a jarra e perguntou, curioso:

- Escuta, por que as serpentes precisam de veneno?

- Porque somos pequenas e fracas – respondeu Surucucu – e precisamos ter presas venenosas para nos defender... mas não tenhas medo: darei a cada serpente apenas uma pequena quantidade de veneno, a fim de que não possamos fazer mal a ninguém...

- Mas é que... - estranhou o guerreiro, cético.

- Bem, já estás com o saco. Deves levá-lo para a tua aldeia e só abri-lo quando chegares lá. Se soltares a noite cedo demais, a escuridão vai empedir-me de distribuir o veneno a cada serpente como pretendo, e as conseqüências recairiam sobre todo o mundo... Com essas palavras, ela se despediu e, sem tardar, convocou todo o povo das serpentes e começou a distribuir o veneno. Surucucu foi a primeira a se servir...

Karu Bempô voltou para a aldeia, carregando a bolsa com todo o cuidado. Pensava no que a serpente havia lhe dito e por isso não percebeu que o papagaio, excitadíssimo, voava acima dele, gritando:

- Venham ver, ele está trazendo a noite, Karu Bempô está trazendo a noite longa!

Evidentemente, todos os que lá estavam podiam vê-lo com os próprios olhos. Os macacos, loucos de alegria, saltavam no topo das árvores; o jacaré fazia ondas com o pouco de água que ainda restava. A onça, impaciente, arranhou-se.

- Solta a noite agora mesmo, o que está esperando? - gritou ela, atirando-se sobre Karu
Bempô.

Antes que o jovem entendesse o que estava acontecendo, a onça arrancou a bolsa das mãos de Karu Bempô, pulou para as urzes e abriu-a.

Uma densa escuridão caiu sobre a selva, surpreendendo a todos. Animais e pessoas procuravam caminhos para voltar a suas casas e colidiam uns com os outros. Mas o pior foi
aquilo que ocorreu com as serpentes da chefe Surucucu: elas se atiraram sobre a jarra, empurrando-se umas às outras, e cada uma delas passou nas presas tanto veneno quanto
podia. Em vão Surucucu tantava acalmá-las, dizendo que havia veneno suficiente para todas. Por fim, acabaram derrubando a jarra.

Mas quando, ao final de uma longa noite, voltou o dia, todos puderam perceber as conseqüências do que a onça havia feito: as serpentes tinham-se tornado inimigas poderosas e audaciosas que, com suas presas envenenadas, matavam todos aqueles de quem se
aproximavam. Apenas o povo das Jibóias não foi atingido, e sempre avisava os índios com sua matraca.

Depois desse episódio, as serpentes nunca mais foram amigas – cada uma procura viver sua vida, sem se preocupar com a dos outros.

Os Munduruku e os outros animais, por sua vez, adoraram ter conseguido a noite de volta. Assim, podem descansar durante a noite para iniciar um novo dia mais dispostos e
alegres.

(MUNDURUKU, Daniel. As serpentes que roubaram a noite e outros mitos. São
Paulo: Peirópolis, 2001. p. 28-34.)

Leia o texto com atenção e responda:

1. Em que tempo ocorreram os fatos narrados? Com que intenção o narrador diz que naquela época a onça ainda não tinha garras?

2. Nesse tempo, os animais falam, há harmonia entre os seres. O desequilíbrio é provocado pela ausência da noite.
a) Copie no caderno passagens do texto que mostram esse desequilíbrio.
b) Releia o segundo parágrafo: num certo momento, o sol é tratado como pessoa. Copie essa passagem e indique as palavras que caracterizam o sol dessa forma.

3. Que fato fez os índios descobrirem que as serpentes haviam roubado a noite?

4. Quando Karu Bempô inicia suas negociações com a Surucucu, ele diz, após se apresentar: “Dizem que as serpentes esconderam a noite. Se me devolverem a noite, darei arco e flechas como presente do meu povo”. Observe que ele escolhe as palavras: em vez de dizer que as serpentes roubaram a noite, ele diz que elas a esconderam. Ele também evita dizer o nome de qualquer pessoa (“Dizem que as serpentes escondem a noite”.). Por que ele faz isso? Na sua opinião, ele é um bom negociador?

5. Releia todo o trecho em que Karu Bempô negocia com a Surucucu.
a) De quantas entrevistas ele precisou para conseguir o que queria? Que avanços você notou em cada negociação?
b) Quando o guerreiro se aproxima da serpente pela primeira vez, é recebido com aspereza: “Quem se atreve a me incomodar? – gritou a serpente, erguendo a cabeça”. Na segunda vez, a recepção já foi diferente, pois o narrador informa: “Dessa vez, Surucucu
estava esperando-o”. Por que essa mudança de comportamento?

6. Surucucu é a representante das serpentes; Karu Bempô, do povo indígena. Eles são
representantes porque têm valor e merecem essa distinção. Por isso, não agem por conta própria, mas em nome do seu povo. Copie do texto passagens que justificam essas afirmações.

7. Com sabedoria e negociação, Karu Bempô conseguiu aquilo de que todos tanto precisavam: a noite. Porém, logo que acordaram da longa noite de descanso, perceberam o poder que as serpentes haviam adquirido. Em outras palavras: conseguiram uma coisa boa, mas, junto, veio uma ruim. Que relação você vê entre esse fato e a realidade?

8. Os mitos explicam a origem das coisas ou por que as coisas são de determinada forma.
Além de explicar como o povo indígena recuperou a noite, que outros fatos esse conto esclarece?

UM CONSELHO CONTRA O CONSELHEIRO

UM CONSELHO CONTRA O CONSELHEIRO

Motivo dos índios guaicurus

A última coisa que Tupã criou, neste mundo, foi o homem.

Havia criado os rios, as plantas, os animais e as aves. Por fim, as tribos. Bondoso, antes de permitir que os homens saíssem a povoar a Terra, mandou distribuir presentes que fossem de utilidade para a vida.

A medida que ia partindo, cada tribo recebia um conselho ou um dom especial. Uma delas aprendeu a cultivar a mandioca e o algodão, para que nos tempos de carestia pudesse viver com o produto das lavouras. A outra foi ensinado fazer canoas e preparar o timbó, para que se dedicasse à pesca.

Ao chegar a vez da tribo guaicuru, já não havia o que dar. Assim, a sua gente saiu pelo mundo entregue a si mesma.

Mas não se conformou com isso. Decidiu pedir a Tupã o favor especial ao qual se julgava com direito. Toda a tribo, homens e mulheres, idosos e jovens, saiu à procura de quem pudesse levar sua queixa ao céu.
Pediram ao vento, que sopra livre e violento pelos descampados, para que, com sua poderosa voz, levasse a Tupã o pedido dos guaicurus.
Mas o vento estava apressado. Passou, encrespando as águas, revolvendo as folhas, e nem sequer ouviu a súplica dos índios.

Pediram ao relâmpago, que rasga o céu e sacode a terra. Mas ele fulgurou e desapareceu, sem lhes dar atenção.

Foram para junto da árvore mais alta da floresta, aquela que quase tocava as nuvens com a sua ramagem, e lhe pediram que nas suas conversas com as estrelas dissesse do desejo da tribo. A árvore, imóvel sob o sol do meio-dia, dormitava e não os atendeu.

Assim caminhou a tribo. Cada vez mais desgostosa. De planta em planta, de animal a animal. Poucos respondiam. Desses poucos, um dizia que suas asas não o levariam tão alto e outro se desculpava alegando que as raízes o prendiam ao chão.

Um dia passaram debaixo do ninho do caracará. O gavião, ouvindo como se queixavam, intrometeu-se:

— Vocês não têm razão!

Os índios estranharam:

— Como assim?! Somos o único povo a não receber de Tupã um favor especial. E contra isso que reclamamos.

O caracará, sempre disposto a tirar proveito dos sofrimentos dos outros, ideou plano que lhe trouxesse vantagem.

— Vocês não entenderam o desejo de Tupã. O presente dado aos guaicurus é maior e melhor do que todos os outros. Se não receberam nada especial é porque tudo quanto existe é de vocês. E de vocês a liberdade de se apoderar do que aparecer em seu caminho. Podem, portanto, caçar e tomar quanto encontrarem e desejarem.

Os índios, admirados e surpresos, pediram ao gavião que explicasse melhor qual o presente que, sem saber, haviam recebido.

O espertalhão repetiu:

— E a liberdade de tomar para si tudo quanto encontrarem em seu caminho e lhes agradar.

Depressa os homens se convenceram de que o caracará tinha razão. O cacique insistiu:

— Então podemos matar tudo o que encontrarmos?

A ave rapineira, certa de que os guaicurus fariam, daquele dia em diante, grandes caçadas das quais ela tiraria a melhor parte, assegurou:

— Sim, tudo!

Rápido, o cacique armou o arco de guerra e visou o caracará.

Percebendo o perigo, o gavião mau conselheiro tentou fugir. Mas ainda não havia aberto de todo as asas, e a flecha partira do arco...

E era uma vez um caracará!

A tribo dos guaicurus tomou para seu símbolo a figura do caracará que os ensinou a caçar, e desde esse dia seguiu de perto os seus conselhos.

DONATO, Hernâne. Contos dos meninos índios. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2006.

OS CURUMINS QUE SE TORNARAM ESTRELAS

OS CURUMINS QUE SE TORNARAM ESTRELAS

Era uma vez sete orfãozinhos.

Quando ficaram sem os pais, foram viver com a avó, índia tão velhinha que mal podia cuidar de si mesma. No entanto, repartia de bom coração, e com amor, as suas pobres coisas entre os sete netos.

Mas não demorou e a boa velha morreu também.
Os curumins ficaram sem parente com quem morar.
Passavam o dia com fome e a noite com frio.

O maiorzinho saía à procura de alimentos, trazendo, às vezes, frutas, mel e raízes. Mas era pequeno demais para subir às árvores e fraco para tentar a caça. Com isso todos sofriam, pois raramente tinham alimento suficiente.

Uma noite, deitados, bem apertadinhos para aquecerem uns aos outros, ouviram chegar o vento.

Nas paredes de palha da cabana antiga, o vozeirão do vento cantava assim:

— Uh!... Uh!... Uh!...

O mais velho dos irmãos lembrou:

- O vento vem do céu e está quase sempre contente! Não é um grande brincalhão? Ele encrespa as águas, despetala as flores, derruba os frutos, revolve os galhos. O lugar onde ele mora deve ser o país da alegria! Vamos todos para o céu?! Lá, certamente, não hão de faltar peles para nos cobrir, frutos e mel para nos alimentar, brinquedos para nos divertir e mãos amigas para nos acariciar!

Todos concordaram e se aprontaram para subir ao céu. O resto da noite ficaram imaginando como seria a vida lá em cima.

Ao amanhecer, o vento que vinha de regresso, depois de percorrer toda a Terra, ouvindo o desejo dos pequenos e sentindo pena deles, começou a soprar, devagar, devagar...

Levados pelo vento, os curumins foram subindo, subindo, passaram pelas nuvens, mais alto, sempre mais alto... Quando anoiteceu, estavam quase no céu. Mas já era tarde, e o vento devia voltar a soprar pelas terras de todos os homens, pois essa é a sua obrigação, noite após noite. Deixou os meninos ali, um pouco abaixo do céu, um pouco acima das nuvens!

Tupã, vendo os pobrezinhos naquela posição incômoda, nem na terra, nem no céu, transformou-os em estrelas. Formaram a constelação que os índios chamam “Sete-Estrelo” — e os civilizados, “Plêiades” —, em homenagem aos irmãozinhos que, depois de muito sofrer na Terra, receberam no céu luminosa recompensa!

DONATO, Hernâne. Contos dos meninos índios. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2006.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

CONTOS E MITOS INDÍGENAS

OS CURUMINS QUE SE TORNARAM ESTRELAS

Era uma vez sete orfãozinhos.

Quando ficaram sem os pais, foram viver com a avó, índia tão velhinha que mal podia cuidar de si mesma. No entanto, repartia de bom coração, e com amor, as suas pobres coisas entre os sete netos.

Mas não demorou e a boa velha morreu também.
Os curumins ficaram sem parente com quem morar.
Passavam o dia com fome e a noite com frio.

O maiorzinho saía à procura de alimentos, trazendo, às vezes, frutas, mel e raízes. Mas era pequeno demais para subir às árvores e fraco para tentar a caça. Com isso todos sofriam, pois raramente tinham alimento suficiente.

Uma noite, deitados, bem apertadinhos para aquecerem uns aos outros, ouviram chegar o vento.

Nas paredes de palha da cabana antiga, o vozeirão do vento cantava assim:

— Uh!... Uh!... Uh!...

O mais velho dos irmãos lembrou:

- O vento vem do céu e está quase sempre contente! Não é um grande brincalhão? Ele encrespa as águas, despetala as flores, derruba os frutos, revolve os galhos. O lugar onde ele mora deve ser o país da alegria! Vamos todos para o céu?! Lá, certamente, não hão de faltar peles para nos cobrir, frutos e mel para nos alimentar, brinquedos para nos divertir e mãos amigas para nos acariciar!

Todos concordaram e se aprontaram para subir ao céu. O resto da noite ficaram imaginando como seria a vida lá em cima.

Ao amanhecer, o vento que vinha de regresso, depois de percorrer toda a Terra, ouvindo o desejo dos pequenos e sentindo pena deles, começou a soprar, devagar, devagar...

Levados pelo vento, os curumins foram subindo, subindo, passaram pelas nuvens, mais alto, sempre mais alto... Quando anoiteceu, estavam quase no céu. Mas já era tarde, e o vento devia voltar a soprar pelas terras de todos os homens, pois essa é a sua obrigação, noite após noite. Deixou os meninos ali, um pouco abaixo do céu, um pouco acima das nuvens!

Tupã, vendo os pobrezinhos naquela posição incômoda, nem na terra, nem no céu, transformou-os em estrelas. Formaram a constelação que os índios chamam “Sete-Estrelo” — e os civilizados, “Plêiades” —, em homenagem aos irmãozinhos que, depois de muito sofrer na Terra, receberam no céu luminosa recompensa!

DONATO, Hernâne. Contos dos meninos índios. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2006.

Mitos e Contos Indígenas

COMO APARECERAM OS ANIMAIS

Motivo dos índios caingangues

Depois do dilúvio, a Terra ficou desabitada. Salvaram-se alguns homens da tribo dos caingangues, mas nenhum dos animais que antes viviam pelas matas e campos.

Sem o trinado dos pássaros e os gritos dos animais, o silêncio das noites era aterrador. E muito triste a solidão dos dias. Com medo das trevas, os índios acendiam fogueiras para dormir ao seu redor. Continuamente, pediam a Tupã que mandasse bichos para o mato e soltasse aves no céu.

Afinal, Tupã compadeceu-se e resolveu atendê-los.

Mandou então Cadjurucre, herói já morando no céu, que descesse à Terra e criasse animais. Deveria também dizer a cada um deles quais os seus modos e meios de vida, costumes, alimentos, obrigações.

Cadjurucre descia todas as noites, trabalhava e voltava ao céu à primeira luz da aurora. Com o orvalho recolhido às folhas da taioba, umedecia as cinzas e os carvões da primeira fogueira acesa pelos homens, passado o dilúvio. Usando a mistura, modelava os animais. Enquanto seus dedos davam forma aos bichos, repetia.as ordens de Tupã aos futuros moradores dos matos, campos e rios.

Na primeira noite fez a onça, que é a rainha da selva. Na segunda, o guariba, que domina as altas árvores. Em seguida, o gavião-de-penacho, o gambá, a arara, a guaiquica, o jacaré, a capivara, a pacarana, o veado e uma infinidade de aves e peixes.

Seu trabalho tomou muito tempo. Ensinou a suçuarana a miar, o veado a correr e a saltar, o macaco a trepar pelos troncos e cipós. Fez o tatu cavar buraco, mandou a tartaruga nadar, quando estivesse no rio, e caminhar, quando estivesse em terra. Ao amanhecer, o bicho criado durante a noite sumia rumo a sua morada.

Certa manhã, de volta ao céu, ouviu de Tupã:

— Basta de criar animais. Céu e Terra estão de tal modo cheios que eles já lutam entre si. Há caça suficiente para os homens. Não precisa voltar à Terra!

Cadjurucre explicou:

— Restam três carvões e um punhado de cinzas.

Diante disso, Tupã concedeu:

— Na próxima noite, você criará o último animal. Não deixe sobras das cinzas e dos carvões. Depois, descansará. A floresta, o campo, as águas e o céu estão cheios de vida.

Ao anoitecer, o enviado de Tupã começou a trabalhar com grande vontade. Queria aproveitar todo o material sobrado da primeira fogueira.

Fez coisas extravagantes Modelou uma cauda longa e larga, um corpo grande e forte, braços robustos, unhas compridas e afiadas. E um focinho mais longo, bem mais longo do que o focinho dos outros bichos. Não poupou nada. Nem um cisquinho de carvão, nem uma pitadinha de cinza, O último bicho estava saindo o mais desproporcionado da criação!

Trabalha e trabalha, põe uma coisa daqui, um pelo dali, uma mancha deste lado, uma cor mais forte do outro, e de repente viu-se surpreendido pelo anunciar do dia. E não havia terminado o trabalho! Faltavam, ao estranho animal, a língua e os dentes!

Clareava. Devia voltar ao céu.

Cadjurucre, num gesto rápido, colheu uma folha de capim, longa, macia e flexível, e enfiou-a na boca do animal. Já não tinha tempo para outra coisa. O Sol nascia!

De partida, disse ao bicho que acabava de criar:

— Essa é a sua língua. Você já pode falar. Corra para o campo que o dia vem nascendo.

Mas o bicho não se moveu, como que esperando por mais alguma ordem.

Cadjurucre, subindo para o céu, perguntou:

— E então?! O que espera?! A criação está terminada. Não posso fazer mais por você!

O animal, erguendo-se sobre as patas traseiras e apontando para a boca disforme, gritou:

— Se não possuo dentes como os outros animais e se tenho uma língua comprida e macia, mas pouco resistente para as comidas duras, o que é que vou comer?

Quase desaparecendo entre as nuvens e os raios do Sol, Cadjurucre aconselhou:

— Pois, se não tem dentes, deve alimentar-se do que não precisa ser mastigado: formigas! Para apanhá-las, use a língua comprida e ágil!

Já com fome, o bicho partiu à procura de formigueiros. Ainda anda pelo mato e pelo campo, com o longo focinho e a cauda em forma de leque, à cata de formigueiro. Quando o encontra, mete por ele a língua e recolhe o seu alimento: formigas.

Por isso, os índios chamaram esse animal pelo nome de tamanduá, que para eles quer dizer: caçador de formigas!

DONATO, Hernâne. Contos dos meninos índios. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2006.